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terça-feira, 13 de agosto de 2013

Fundação Saramago

Tem gente que nasceu para ter uma vida bonita. Mas José Saramago exagera nessa beleza. Discreta e sensível, a vida do autor é cheia de detalhes que merecem atenção. Desde a sua tardia carreira dedicada unicamente para os romances, de seu casamento também tardio (ou no tempo certo) com a Pilar Del Río, ou, simplesmente, pelo o fato de ser de uma família de lavradores analfabetos.

Hoje existe a Fundação Saramago. A fundação obedece as manias do autor: tem uma beleza construída pelos detalhes. O prédio em si já é uma pérola na história. Situada na Casa dos Bicos, com uma arquitetura atípica do século XVI. A casa foi construída por uma família da nobreza, mas com o passar dos anos o casarão teve inúmeras funções, até mesmo armazém de bacalhau (veja bem, a morada da casa é a rua dos bacalhoeiros) durante o século XX. Agora ela está sob o poderio da Câmara Municipal de Lisboa e será da Fundação Saramago por 20 anos.

A Fundação nos aproxima mais ainda do mundo de Saramago e, por conseguinte, de Pilar. Museus e fundações de escritores são sempre emocionantes, têm aqueles objetos pessoais: os óculos, os livros, as fotos. No caso de Saramago, sua agenda aberta na anotação de seu primeiro encontro com a jornalista que depois seria sua esposa e presidente da sua fundação. Fora os relatos de viagens e etc.

Mas a particularidade mais linda dessa história é sobre a oliveira que está em frente ao prédio. Ela veio de Azinhaga do Ribatejo, aldeia em que José Saramago nasceu, e junto com suas raízes estão enterradas as cinzas do autor. A terra que envolve raízes e cinzas são de Lanzarote, ilha do arquipélago das Ilhas Canárias, local em que Saramago viveu durante muito tempo e até a sua morte, e onde está também localizada a biblioteca que ele criou e inaugurou ao lado da esposa.

Bem, cinzas são só cinzas e não dizem nada, é verdade. Mas elas estão justificadas pela descrição da lápide, escrita no chão, logo ao lado da oliveira. Lá está: “Não subiu para as estrelas, se à terra pertencia”. A frase foi retirada da obra Memorial do Convento, é a última frase do livro que se apresenta exatamente assim: “(...), mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Bilimunda”.




Pois, não subiu para as estrelas se a vida está presa nos livros, nas palavras. Que lemos, relemos e as fazemos viver toda vez que indicamos aos grandes amigos. Uma vida que por causa da literatura não é esquecida, tem que estar mesmo presa às terras de uma oliveira de onde tudo começou.